A Associação Indígena Bororo Tugo Baigare, da etnia Bororo que representa mais de 400 indígenas da Aldeia Córrego Grande, Terra Indígena Teresa Cristina em Santo Antonio do Leverger (a 33 km de Cuiabá), cobra da Fundação Nacional do Índio (Funai), da Secretaria de Meio Ambiente de Mato Grosso (Sema) e do Ministério Público Federal (MPF) o cumprimento de deveres obrigatórios com os indígenas, entre eles a Consulta nos termos estabelecidos pela Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho).
Na prática a comunidade indígena quer ser consultada diante da instalação da PCH (Pequena Central Hidrelétrica) Mutum, de acordo com o presidente da Associação, o empreendimento já pode ter recebido a LI (Licença de Instalação) em uma área de transição Cerrado-Pantanal, em uma região pantaneira com inúmero potencial hídrico.
“Não somos contra a instalação da PCH, e nem desejamos tumultuar o processo, mas exigimos o cumprimento do protocolo de Consulta nos termos estabelecidos pela Convenção 169 da OIT, a Sema e a Funai, bem como o MPF precisam ser cumpridores da Lei, o que solicitamos a estes competentes órgãos é a apresentação do projeto da PCH, pois com a LI, as prováveis instalações já podem estar ocorrendo, e se houver impactos e prejuízos ambientais os órgãos que descumpriram a OIT deveriam ser responsabilizados. Nossa comunidade precisa ter ciência deste empreendimento, não podemos mais tolerar a indiferença com nossos direitos”, explica o presidente da Associação, Estevão Bororo Taukane.
E razão do descumprimento do Protocolo de Consulta, a Associação fez três protocolos no dia 17 de fevereiro, solicitando respostas da Sema, Funai e MPF.
“Ainda não recebemos da Sema, nem da Funai ou MPF qualquer informativo sobre o licenciamento ambiental da PCH Mutum e nenhuma resposta ainda quanto as solicitações protocolizadas”, reforça.
Um dos protocolos pede à Funai que interceda junto à Sema para que a pasta esclareça os motivos pelos quais não houve a solicitação de submissão ao processo de Consulta estabelecido na Convenção 169 da OIT, bem como a exigência de elaboração do estudo de Componente Indígena, e caso não tenha sido exigido que seja formalizada com urgência esta exigência para a empresa responsável pelo empreendimento.
“Solicitamos também ao MPF bem como à Sema informações sobre a possível licença expedida para a PCH Mutum, autorizando o inicio das obras. Pois caso tenha alguma licença vigente, vamos exigir a suspensão com urgência até que seja atendida a comunidade, precisamos ser ouvidos, assim como estabelece a legislação”, cobra.
O presidente da Associação alega que causou estranheza o descumprimento da Consulta, pois recentemente, com tal discussão em foco até mesmo no Congresso Nacional, houve acato da Consulta por parte de outros empreendimentos energéticos em Mato Grosso.
“Respeitar o protocolo se traduz em manter vivas as tradições indígenas, nosso legado socioambiental e a preservação da fauna, flora e dos recursos hídricos. Juntos podemos permitir o necessário desenvolvimento, porem com medidas sustentáveis. É para este resultado que a Convenção 169 foi criada”, define.
Outro lado
NOTA DO MPF
O ofício responsável pela demanda esclarece, primeiramente, que há um equívoco nessa informação com relação ao objeto do pedido protocolado pela Associação Indígena Bororo Tugo Baigare, pois eles apresentam preocupação com relação a uma suposta licença de instalação de uma PCH a qual acredita-se chamar "PCH Mutum", provavelmente em referência ao Córrego Mutum, localizada nas proximidades da PCH Mantovilis, também mencionada por eles no ofício protocolado na PR-MT. Existe uma outra PCH chamada "PCH Nova Mutum" , localizada em município de mesmo nome, contudo está distante mais de 300 km da TI Tereza Cristina, não gerando impactos para os Bororo.
O protocolo realizado pela Associação na data de 17 de fevereiro gerou a instauração da Notícia de Fato (procedimento inicial de investigação) n. 1.20.000.000204-2020-54. O procedimento está em fase de apuração, de modo que até o presente momento não há como confirmar se ouve emissão da licença de instalação mencionada na denúncia. Caso de fato tenha sido emitido licença de instalação para o empreendimento denominado PCH Mutum, o Ofício de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais da PRM-MT irá atuar no sentido de garantir o direito a consulta livre, prévia e informada, nos termos da Convenção 169 da OIT, como no caso da PCH Mantovilis, que afeta a mesma comunidade.
Quanto ao fato de os autores da representação terem protocolado a demanda no dia 17 de fevereiro e até o presente momento não terem obtido resposta, há de salientar que nos termos do Art. 3º da Resolução n. 174, de 4 de julho de 2017, do Conselho Nacional do Ministério Público, a qual disciplina, no âmbito do Ministério Público, a instauração e a tramitação da Notícia de Fato e do Procedimento Administrativo, que: "a Notícia de Fato será apreciada no prazo de 30 (trinta) dias, a contar do seu recebimento, prorrogável uma vez, fundamentadamente, por até 90 (noventa) dias".
SEMA E FUNAI – Com relação à Funai e à Sema, o Olhar Jurídico entrou em contato com o setor responsável, em Cuiabá, mas até a publicação desta matéria não recebemos um posicionamento oficial dos órgãos.
