
A Polícia Judiciária Civil de Chapada dos Guimarães emitiu, somente entre 01 de janeiro deste ano até hoje (02), 17 medidas protetivas a mulheres vítimas de violência doméstica. Há várias formas de aplicação de tais medidas, mas principalmente determinam que o agressor deve se manter distante da vítima, sob pena de prisão.
Dessas 17 medidas, 11 geraram instauração de inquéritos, considerando que as vítimas optaram por seguir com os processos. Desses 11 inquéritos instaurados, cinco já foram remetidos para o fórum competente, segundo informações do delegado da PJC de Chapada dos Guimarães, Alexandre Nazareth.
Os processos com base na Lei Maria da Penha (lei federal nº 11.340/06, para coibir violência doméstica contra a mulher) têm suas peculiaridades, pois a vítima tem grande proximidade do agressor (maridos, ex-maridos, etc.). Culturalmente, há outras violências que dificultam a penalização do agressor, como a dependência financeira das mulheres (registrada na lei como violência patrimonial).
São muitas as faces da violência contra a mulher. Conheça:
Violência moral
Entende-se violência moral como formas de humilhação, xingamentos e desprezo quanto à mulher. Seja caluniar – falar mentiras a seu respeito –, difamar – querer denegrir sua imagem – ou falar injúrias.
Violência psicológica
Qualquer ato e fala que vise a desequilibrar a mulher emocional e psicologicamente representa um caso de violência contra a mulher. Diminuir sua auto-estima, controlar o que ela faz ou deixa de fazer e suas decisões. Essas atitudes que violentam a mulher acontecem por meio de ameaça, humilhação, isolamento, vigilância constante, insulto, chantagem, ridicularização, ou seja, atitudes que podem prejudicar sua saúde mental.
Existe também o gaslighting, quando um homem utiliza dessas manipulações para fazer a mulher se sentir louca ou desequilibrada, fazendo-a duvidar de seus pensamentos e posicionamentos. É uma maneira de abuso psicológico no qual informações são distorcidas, seletivamente omitidas para favorecer o abusador ou simplesmente inventadas com a intenção de fazer a vítima duvidar de sua própria memória, percepção e sanidade.
Violência física
Todo e qualquer ato que vise a reprimir a mulher utilizando a força física. Os casos podem variar de puxões no braço dela e empurrões, até socos e espancamentos. As consequências psicológicas são evidentes: como medo – inclusive de denunciar –, insegurança e isolamento. As consequências físicas podem causar hematomas, quebrar ossos, causar fraturas, provocar sangramentos internos (hemorragias) e até causar sua morte. No caso, não seria “apenas” um homicídio, mas sim feminicídio – entenda mais no parágrafo abaixo.
Feminicídio
A cada hora, uma mulher é assassinada no Brasil.
É o homicídio intencional de pessoa do sexo feminino “por conta da condição de sexo feminino”. Logo, é quando alguém comete um homicídio contra uma mulher porque ela é mulher. É considerado feminicídio o crime em que estiver envolvida a violência familiar e doméstica; o menosprezo e a discriminação à condição de mulher. Isso porque 35% dos homicídios de mulheres no mundo são cometidos por seus parceiros – de acordo com a Organização Mundial da Saúde – e outros dados alarmantes levantados pela ONU.
É considerado um crime hediondo, ou seja, o Estado entende como crime mais grave, mais cruel. A lei 13.104, conhecida como a Lei do Feminicídio, tipifica de um crime de discriminação, de preconceito e menosprezo da condição feminina. Foi sancionada pela ex-presidente Dilma Rousseff e entrou em vigor em 2015. Fez mudanças no Código Penal, como estabelecer agravante de pena para a pessoa que cometer feminicídio – estabelecida no inciso 7 do artigo 121 do Código. A pena pode ser aumentada em 1/3 dependendo da condição em que o crime for praticado, como nos casos a seguir:
- Se for realizado durante a gravidez ou nos 3 meses após o parto;
- Contra mulheres com menos de 14 e mais de 60 anos;
- Contra mulheres com deficiência;
- Na presença de parente ascendente ou descendente – da mãe ou da filha da vítima, por exemplo.
A urgência em existir tal lei se deve ao fato de que a cada uma hora, uma mulher é assassinada no Brasil – segundo dados do Instituto Avante. Quase metade desses homicídios ocorre por conta da violência doméstica ou familiar, por uso de arma de fogo; 34% são cometidos com objetos cortantes, como faca; e 7% são feitos por asfixia ou estrangulamento.
Violência sexual
São atos ou tentativas de relação sexual de qualquer natureza sem o consentimento da mulher – e normalmente feitos de maneiras violenta ou sob coação. São cometidas, principalmente por conta da cultura do estupro, que silencia e relativiza a violência sexual contra a mulher. Violência sexual é abuso, assédio e estupro. Pode ser cometida tanto por pessoas desconhecidas como por pessoas conhecidas – segundo o Ipea, 70% dos estupros são realizados por conhecidos da vítima ou com quem mantém algum tipo de relacionamento –, dentro de namoros, casamentos e relações sociais. Os atos englobam quaisquer tipos de relação sexual até, por exemplo, proibir a de mulher utilizar anticoncepcionais, não utilizar contraceptivos contra a vontade dela, obrigá-la ou impedi-la de abortar.
Violência doméstica
Um dos tipos mais cruéis de violência contra a mulher, pois normalmente engloba todos os tipos de violência citados acima. É um tipo de violência velada ou explícita que acontece, literalmente, dentro de casa. Importante salientar que violência doméstica pode acometer tanto mulheres como homens, assim como ser cometida por pessoas de ambos os sexos. Em se tratando de violência doméstica contra a mulher, ela acontece em quaisquer faixas etárias, podendo ser quando ela é criança e/ou adolescente, quando é adulta ou até mesmo idosa. Quem a comete pode ser naturalmente parente da vítima – pai, irmão, primo, tio – como ter parentesco civil – marido, sogro, padrasto.
É comum ouvir o ditado “em briga de marido e mulher não se mete a colher”, como numa tentativa de deslegitimar a mulher que denuncia o abuso que sofre. Segundo dados do Instituto Avon com Ipsos – Percepções sobre a violência doméstica contra a mulher, 2 milhões de mulheres no Brasil são vítimas desses abusos a cada ano. A pesquisa também revela que apenas 63% delas denunciam a agressão. O medo em denunciar pode partir tanto do desamparo financeiro que talvez a mulher sofra, como o marido ameaçar tirar seus filhos dela, ou até por conta de ameaças de morte.
COMO DENUNCIAR VIOLÊNCIA COMETIDA CONTRA UMA MULHER?
O primeiro passo da denúncia é ligar para o número 180. Por meio dele, a mulher entrará em contato com uma central telefônica de atendimento às vítimas, que dará a orientação para as mulheres poderem buscar apoio e explicará os passos que devem ser tomados para resolver o problema. O “Disque 180” foi criado pela Secretaria de Políticas para as Mulheres. As brasileiras podem denunciar agressões de quaisquer tipos. O serviço é gratuito, como qualquer serviço de emergência e urgência, e funciona 24 horas em todos os dias da semana.
Criado em 2005, depois de 10 anos de funcionamento, o serviço de denúncias de agressões contra mulheres chegou aos 5 milhões de atendimentos. Há tanto denúncias sobre violências sofridas, como encaminhamentos aos órgãos competentes para tomar atitudes sobre tais ações ou direcionamento a outras linhas telefônicas competentes, como Polícia Militar, Polícia Civil ou Secretaria de Direitos Humanos, o disque 100.
Lei Maria da Penha
A Lei 11.340 é popularmente conhecida por Lei Maria da Penha, em homenagem à mulher que sofreu violência doméstica por anos e lutou para a aprovação de alguma medida que coibisse essa atitude. Maria da Penha Maia Fernandes ficou paraplégica devido a um tiro que levou do marido, que tentou matá-la novamente após esse crime.
Maria da Penha travou uma verdadeira batalha judicial desde 1983 contra seu agressor, a fim de que ele fosse condenado. Depois de vários entraves no processo, em 2001, o caso foi levado à Corte Interamericana de Direitos Humanos e o Estado brasileiro foi condenado por omissão, negligência e tolerância perante violência doméstica contra mulheres.
Dentre as várias imposições que a Corte impôs ao governo brasileiro, uma delas foi a criação de políticas públicas que visassem à proteção da mulher e facilitassem a denúncia de agressões. Dessa forma, a Lei Maria da Penha foi criada em 2006 no Congresso Nacional, por unanimidade e já foi considerada pela ONU como a terceira melhor lei contra a violência doméstica no mundo. Apesar de ainda existirem obstáculos para as denúncias contra agressões, entre os anos de 2006 e 2013 o número de denúncias aumentou em 600%.
Os principais pontos positivos da criação da Lei Maria da Penha foram:
- A possibilidade de o agressor ser preso em flagrante ou ficar em prisão preventiva, logo após a denúncia da mulher;
- A violência contra a mulher ser um agravante de pena, ou seja, aumenta a possibilidade de uma pena maior ao agressor;
- A mulher poderia, antes da lei, desistir de denunciar seu agressor já na delegacia – por medo de fazê-lo, por ameaça e humilhação. Porém, agora só pode fazer isso perante o juiz;
- Medidas de urgência que tiram a vítima do convívio com o agressor – antes da lei, as mulheres ficavam à mercê de novas ameaças e agressões, que poderiam resultar em ela desistir de ir em frente com o processo, por exemplo;
- Em 2012, o Supremo Tribunal Federal decidiu que qualquer pessoa pode denunciar violência contra mulher, não apenas a vítima – provando que é necessário, sim, botar colher em briga de marido e mulher.