
Desde que passou a depender exclusivamente da pesca para criar seis dos sete filhos, com o fechamento da Usina Aricá, em 1968, seu Ambrósio José da Silva, hoje com 79 anos, aposentado, e morando em Santo Antonio do Leverger, sempre ouviu falar de duas figuras mitológicas e cuja simples menção dos seus nomes deixava os pescadores de cabelos arrepiados: o Minhocão do Pari e o Neguinho D’água.
Diz a centenária lenda que o Minhocão do Pari apareceu e viveu sempre na Barra do Pari, uma comunidade que fica nos fundos do Jardim Santa Amália, onde o ribeirão Pari deságua no Rio Cuiabá, do lado de Várzea Grande. Mas de vez em quando – juram ribeirinhos mais antigos – o medonho minhocão abandonava o seu hábitat e subia ou descia o rio para ir assustar pescadores de outros lugares, virando suas canoas movidas a remo naqueles tempos.
O Neguinho D’água não era perigoso. Mas era bom que só ele numa peraltice, principalmente quando queria irritar pescadores e afugentá-los dos locais onde “apoitavam” suas canoas: enganchava anzóis nas pedras ou galhos de árvores no fundo do rio, amarrava-os uns nos outros, tirava habilmente suas iscas sem o pescador perceber... essas coisas traquinagens.
Diz a lenda que o Minhocão do Pari gostava de passear para assustar os pescadores
Assustar mesmo os invasores do rio só quando ele decidia vir à tona e sentava na proa das embarcações, fazendo a canoa balançar para o pescador errar a fisgada. E o Neguinho D’água se divertia quando os pescadores, geralmente bons nadadores, apavorados, abandonavam suas canoas, pulando na água para se livrarem da sua presença...
Recorda seu Ambrósio que um dia ele estava pescando no Rio Cuiabá junto com os companheiros Francisco e Augusto, abaixo da Usina de Aricá, usando anzol de gancho para pegar só peixe graúdo. De repente, começaram a notar que as ondas que balançavam a canoa em que pescavam estavam aumentando rapidamente de altura e intensidade.
Não demorou e descobriram o motivo: era o Minhocão do Pari, que de tão comprido e grosso, mais parecia uma grande canoa emborcada. Fixaram o olhar no bicho, enquanto recolhiam seus anzóis, para ter certeza que não estavam tendo uma visão, e não tiveram dúvidas: era mesmo uma minhoca gigante, supostamente o Minhocão do Pari, numa das suas incursões pelo Rio Cuiabá.
Remando feitos desesperados, chegaram à praia, perseguidos pelas ondas, que aumentavam mais e mais de altura, embora eles já estivessem bem longe da margem do rio. Enquanto corriam, fazendo um esforço descomunal para arrastar a canoa na areia até chegarem a um lugar seguro, fora do alcance das ondas, ninguém olhou para trás para ver se era mesmo o lendário minhocão que estava fazendo as águas ficarem revoltas com aquela fúria!...