
O dialeto cuiabano é uma das maiores representações de força, originalidade e identidade da cultura tradicional do estado de Mato Grosso. No entanto, é importante observar que, no cenário nacional, frente às variações linguísticas, o dialeto permanece desconhecido e desvalorizado. Por isso, essa manifestação cultural precisa se ajustar às constantes influências da era digital, para que possamos entender como se comportará nesse contexto.
Um exemplo claro da desvalorização do dialeto cuiabano pode ser visto na forma como a grande mídia o aborda. Em um episódio do Fantástico, em 2021, transmitido pela Rede Globo, o programa exibiu um quadro de notícias esportivas com fantoches de cavalinhos, representando os times do campeonato brasileiro. Na ocasião, o Cuiabá Esporte Clube, em sua estreia na primeira divisão, foi anunciado por Tadeu Schmidt, apresentador do referido programa. No entanto, para decepção dos torcedores, o cavalinho que representava o Cuiabá utilizou uma variação linguística de Minas Gerais, completamente alheia ao falar cuiabano.
Esse equívoco gerou grande indignação entre os mato-grossenses. No domingo seguinte, o programa, através de seu apresentador, precisou se retratar com o público, apresentando novamente o cavalinho do Cuiabá, dessa vez falando adequadamente a variação linguística local. Dessa forma, é fácil perceber que, ao apresentar personagens matogrossenses em novelas e filmes, a grande mídia costuma optar por um “caipirês” genérico, sem se preocupar com as particularidades e riquezas da nossa cultura.
O dialeto cuiabano é forte o suficiente para ser moldado, mantendo-se vivo e fresco na mente dos falantes.”
Mesmo com grandes autores, atores, poetas e outros artistas, Mato Grosso ainda não conquistou o espaço de respeito e destaque que merece no cenário nacional para o grande público. No campo da internet, por sua vez, há influenciadores digitais que utilizam o dialeto cuiabano em seus vídeos e postagens nas redes sociais. Esse fenômeno é interessante, do ponto de vista da sociolinguística variacionista, pois oferece um campo fértil para estudar como essa variação linguística se comporta entre os jovens e como pode se perpetuar no futuro.
Um exemplo da combinação entre o tradicional e a inovação digital é a página no Instagram “Xomano que mora logo ali”. O nome faz referência à frase popular da série norte-americana Todo Mundo Odeia o Chris, em que um personagem popularizou a expressão “carinha que mora logo ali”.
A página mistura essa frase do universo jovem e digital com o uso da palavra “xomano”, que significa “amigo” na tradição cuiabana. Isso demonstra que o dialeto é forte o suficiente para ser moldado pelas transformações da globalização, mantendo-se vivo e fresco na mente dos falantes.
Em suma, a variação linguística presente em Cuiabá e nas regiões de Mato Grosso ainda é desconhecida no contexto das variações linguísticas nacionais. É necessário que a grande mídia respeite a cultura estadual por meio de investimento em artistas locais para incentivar e valorizar nossa cultura.
Além disso, vale destacar que, frente às transformações digitais, os falantes nativos do dialeto cuiabano estão se adaptando, perpetuando essa variação por novos meios e fortalecendo a cultura estadual, que merece maior destaque, preparando-a para ser descoberta no cenário nacional.
Por: Nilton Mazochin Mestrando em Letras pela Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT) E-mail: nilton.mazochin@unemat.br * Este texto foi produzido para a disciplina Teoria Linguística, do Programa de Pós-Graduação em Letras (UNEMAT/Sinop), sob orientação da profa. Dra. Leandra Ines Seganfredo Santos.